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Goela abaixo

Marcos Fayad

 

É cruel com quem não tem televisão a cabo e só tem a telinha da TV aberta pra se divertir com os insossos programas diários.

Além da fraca oferta do eterno arroz-com-feijão ainda tem de suportar coisas e pessoas desfilando diante de seus olhos a massa desandada de um bolo tosco de fubá grosseiro.

Mesmo quem não desenvolveu um nível de exigência sofisticado suporta mais as repetições de bordões, cacoetes e outras chatices que nos enfiam goela abaixo.


Quem agüenta ainda assistir a canastrice dramática daquela atriz seqüestradora de crianças, enrolada em cobertores, sendo carregada nos braços por um policial escalado?

Deve ser ainda mais difícil carregá-la sob o peso de seus pecados.

A tal senhora com todo seu rosário de enfermidades e fazendo cara de vítima só consegue despertar asco e indignação nas pessoas.

É uma criminosa confessa e comprovada que ainda causa muitas dores em famílias que lesou e a quem surrupiou os filhos, nunca mereceu nem meio metro de fita de vídeo gasto com ela pelas TVs.

Impossível não vê-la de mês em mês com sua cara de madalena hipocritamente arrependida, estragando o jantar de milhares de pessoas. Isso sem falar nas caras de suas filhas agressivas, sempre prontas a afastar os repórteres.


E aquela famosa atriz antiga e falsamente sorridente interpretando canhestramente goianas e mineiras para vender seu produto num texto primário que nos considera a todos os goianos como indigentes mentais?

É de doer.

Mas dói mais ainda ter de ouvir o português e as concordâncias que certos vereadores usam nas suas declarações à imprensa, sem conteúdo nem forma.

Já que não merecemos seu ostracismo deveríamos, no mínimo, merecer seus silêncios.


Repetitivo e sonolento são também os cacoetes repetidos ad infinitum por um certo apresentador de um programa de merchandising que se especializou em elogios e puxa-saquismos a todos os entrevistados de seu supermercadão televisivo.

E tome frases feitas do tipo “estou aqui com esta criaturinha maravilhosa” ou “gente, este é o maior incentivador da culinária goiana” quando todos sabem que qualquer pastel de feira é melhor do que o que ele anuncia.

E desce melhor goela abaixo.

Nem é preciso dizer que a trilha sonora dessas bobagens é o tilintar da caixa registradora.


E não são apenas esses programas horrorosos que só existem porque seus empresários-apresentadores compram o horário pra nos torrar o saco.

Basta sair de casa para encontrar empilhadas nos hotéis, bares e restaurantes de muitas cidades goianas aquelas dezenas de revistas com nomes em inglês que só são editadas para promover pessoas se fingindo de ricas e finas circulando pelas mesmas festas com seus ares bregas e sua falta do que dizer.

Fotos e fotos impressas em caríssimo papel couché brilhante vendem a idéia de um Goiás pairando acima da realidade.

Matérias e colunas comprovam que seus redatores e colunistas provincianos jamais leram um livro, empenhados que devem estar todo o tempo na caça insana de conseguir notinhas sobre o nada.


São a coisa mais profunda em matéria de vazio, mas posam de jornalistas bem informados. Insuportável.


Para qualquer pessoa parece evidente demais, até redundante, as pilantragens de que uma certa família lançou mão para enganar investidores ambiciosos que acreditaram na criação de avestruzes como meio de enriquecer rapidamente.

Mais que evidente, por tudo o que os jornais já levantaram e publicaram, que só quem enriqueceu foi a tal família exibindo seus carros de luxo, seus imóveis ostensivos e seus esbanjamentos com o dinheiro alheio.

A justiça também sabe.

No entanto somos obrigados a ver e ler a repetição manhosa dos trâmites a que lançam mão para escapar da lei. São sempre as mesmas entrevistas, as mesmíssimas explicações, as cenas deprimentes de milhares de animais morrendo de fome, as suposições e nenhuma atitude concreta.

Há ainda alguma outra saída para essa família que não seja a cadeia?


Não há escapatória, caro leitor, basta ligar a TV ou ler os jornais e a gororoba repetitiva salta diante de nós, pobres coitados que para assistir um programa de TV somos

capturados e bombardeados nessa rede de mesmices e mentiras.


Ou se recorre ao controle remoto ou a um bom livro capaz de nos fazer acreditar que o mundo ainda não está totalmente subjugado pela mediocridade, que ainda há vida inteligente fora dos bordões idiotas, os cacoetes e o merchandising.

Marcos Fayad é ator e diretor de teatro
bomcombate@uol.com.br

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CRÔNICAS di-VERSOS
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eNT . Revista Eletrônica Nádia Timm . 2006