Plínio Marcos em um dos seus points favoritos, o Restaurante Gigeto, em São Paulo

Balada de um palhaço

"A Balada de um Palhaço" é uma das obras mais poéticas de Plínio Marcos.

Foi idealizada em 1985, quando o autor estava hospitalizado após seu primeiro enfarte.

Escrita em meados de 1986, estreou no mesmo ano no Teatro Zero Hora, em São Paulo. Bobo Plin (nome de um dos personagens) era o modo como o autor se autonominava, desde muito tempo antes de escrever a peça, nas brincadeiras com os filhos, nos bilhetes que assinava.

 

Abaixo crítica de VIVIEN LANDO, publicada no jornal
O Estado de São Paulo, em 02/10/1986

Melancolia da humanidade

Milenar depositário teatral das amarguras do mundo, o palhaço costuma cumprir quase sempre o papel de metáfora da vida do artista nos bastidores.

Aquele que faz o público, cruel e ignorante, rir – e por trás da máscara de humor chora todas as dores.

Exageros à parte, sua função conscientizadora é tão tradicional quanto as gags que executa no picadeiro. E Plínio Marcos não hesitou em regatar, uma vez mais, esses cavaleiros da triste figura para servirem de porta-vozes de sua eterna indignação.

Bobo Plin (Walderez de Barros) é o palhaço que entra em crise, sai enlouquecido buscando a identidade – sua alma, como diz -, não dá valor às minúcias materiais do palneta e, em última instância, rebela-se contra um repertório fixo, copiado, que só visa o sucesso fácil. Seu contraponto, o palhaço Menelão (Antônio Petrin) diretor do circo, representa a razão, a prática, a objetividade, o chão, enfim.

Os dois estranham-se na conversa, no nível racional, mas se entendem muito bem através do canal da afetividade. Com um empecilho: Menelão jamais poderá aceitar o atributo inquietante e instigante que Bobo Plin pretende imprimir a seu trabalho.

Para ele, a alegria do circo continua sendo o palhaço – e talvez uma surra de chicote consiga convencer o parceiro do mesmo.

É aí que entra o dado repetitivo do dramaturgo Plínio Marcos. Explícito, ostensivo, ele cria em Bobo Plin o artista como deve ser – em sua opinião.

Utilizando uma dureza contagiosa, transforma o personagem em discurso, inocente útil das idéias que quer transmitir. Como se uma figura completa e densa como esse palhaço infeliz não fosse suficiente para colocar em cena a advertência severa que Plínio faz à gratuidade na arte.

De certa maneira, é uma forma de subestimar a inteligência da platéia, obrigando-a a repetir a tabuada, da consciência até a exaustão. Vide a dispensável fala de Bobo Plin contra o consumo.

Nada disso, entretanto, faz o espetáculo perder a força. Para contrabalançar a aspereza do texto, conta-se com o impecável trabalho dos atores.

Antônio Petrin, na pele de um Menelão obtuso e simplório, que fala por repetições de sílabas, entra em cena com o peso necessário e em momento algum se deixa ofuscar pelo brilho de Walderez de Barros.

Ela, por sua vez, como em Madame Blavatsky, do mesmo autor, que lhe valeu vários prêmios, dá um show de sensibilidade.

Em cada gesto, em cada expressão, em cada entonação, Bobo Plin é o clown universal, masculino e feminino, criança e adulto, adulto, alegre e triste. Tão pequeno quanto sua inutilidade, ao não conseguir ser engraçado nem para o próprio parceiro. Tão grande que sabe trazer para o palco, toda a melancolia da humanidade.

eNT...

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eNT . Revista Eletrônica Nádia Timm . 2006