A Vida no Cinema

Entrevista com Lucas Valadares e Edgard Navarro

por Nádia Timm

 

“Seja em Porto Alegre, Goiânia, Brasília, São Paulo, Rio, Tiradentes... Cada cidade onde assisto ao filme, em festivais ou em salas de cinema, as pessoas têm formas diferentes de abordar minha participação em Eu me Lembro. Mas sempre estão presentes a descoberta da sexualidade, das drogas e a religião”, diz o ator, que nunca experimentou drogas.

Caretice? Nada disso. Lindo, profundo, sensível. Lucas Valadares ainda não pintou na telinha. Azar da Globo e similares.

Há dois anos, está em São Paulo. Deixou Salvador para estudar arte dramática, na USP.

Passou pelo Oficina de Zé Celso Martinez, atuou recentemente em Um Bonde Chamado Desejo, um clássico da dramaturgia norte-americana, dirigido por Damasceno, trabalha em publicidade e, com atenção, acompanha a trajetória do filme que vai entrar no circuito internacional de festivais de cinema.

2002 é uma data inesquecível para o rapaz. O jovem ator que tinha participado de cinco curtas, na Bahia, voou mais alto neste ano. Atuou no filme autobiográfico de Edgard Navarro, ovacionado no Festival do Cinema Brasileiro de Brasília, em 2005, onde recebeu sete prêmios e mais dois no FestCine Goiânia, em 2006.

Em 2007, Eu me Lembro vai participar de festivais em várias regiões do mundo: Toulouse, na França, Cairo, no Egito, em Montreal, Canadá e em Palm Springs, nos EUA.

Sobre sua participação, interpretando o protagonista em sua idade adulta, o moço Guiga que sofre com os valores burgueses e que vai fundo no desbunde daquela geração, Lucas confirma com todas as letras: “É um marco, sem nenhum folclore, uma virada. Este filme é muito revelador para mim. Descobri muitas coisas e a ficha ainda está caindo, na medida em que o assisto novamente’’.

Ei Lucas, mas o que mudou? “A percepção de minha vida, a carreira, o que busco. Edgar fez seu primeiro longa depois de trinta anos. Me identifico muito com ele, a empatia é muito grande. Foram sete semanas de trabalho, a história real de vida, do fazer cinema, as condições em que foi feito. E foi feito num momento sereno”, responde.

O enredo focado na vida do diretor, nas descobertas de sua primeira infância, em uma tradicional, hipócrita, machista, racista e católica família dos anos dourados.

A alegria aos poucos ganha peso de tragédia e sofrimento. Na medida em que cresce, Guiga toma consciência das limitações e violências que abrangem não apenas o lar, mas a sociedade brasileira em plena ditadura militar e o mundo. Ele faz parte geração que ousou romper com o sistema e experimentar alternativas, em todos os níveis, pagando um alto preço: a sanidade.

Lucas recorda de uma cena marcante, pela qual foi escolhido para o papel. “A briga com pai foi muito forte. Edgard me deu um tapa na cara pra valer...”

Neste exato momento da entrevista, o diretor chega à recepção do hotel, onde converso com Lucas. Edgard entra direto no assunto e repete como mexeu com os brios do ator. “O tapa surtiu efeito, provocou, ele foi fundo, alcançou a dramaticidade da cena”.

Concorda comigo quando menciono que o pano de fundo é o drama da culpa, alimentado pela religião católica e que o filme vai ficando mais denso e triste.

A cena final, a grande viagem psicodélica, é um belo momento. Nele a o reencontro, a ciranda com a memória afetiva, lindo e surreal como um filme de Fellini, no qual o cineasta revela a dimensão do cinema em sua vida. Ali, lembra Lucas, é o fecho, onde surge a proposta de metalinguagem num detalhe na imagem final.

O próximo mergulho de Edgard Navarro será Eu, Pecador, filme em fase de captação.“Este não tem nada de autobiográfico. É contra o racismo e repressão sexual dentro da Igreja Católica”, adianta o cineasta.

Quanto a Lucas. É tempo de curtir as vitórias de Eu me Lembro, tirar as lições do trabalho, ganhar consistência para seguir a diante. Sempre com prazer.

Goiânia, 25 de novembro de 2006

Assista ao triller de Eu me Lembro aqui

Contato de Edgar Navarro

Lucas Valadares e Edgard Navarro participaram do 2o FestCine Goiânia, realizado de 13 a 20 de novembro de 2006

eNT...

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eNT . Revista Eletrônica Nádia Timm . 2006