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Viviane Maia - jornalista

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

“Vamos brigar para manter isso. Custe o que custar!”

VM - Uma década de atividade é motivo de sobra para se comemorar. Foi um balde de água fria não conseguir captar o recurso conseguido via Lei Estadual de Incentivo à Cultura, a Lei Goyazes?

Leonardo Razuk - Com certeza. A cada ano, planejamos inovar e aumentar os festivais que realizamos e, com esse especificamente, tínhamos planos ousados. Dez anos são dez anos! Poucos festivais conseguem chegar a essa marca e ainda manter seu caráter inicial. Queríamos fazer algo como Goiânia nunca tinha visto. Chamamos uma das bandas mais importantes da história do rock mundial, o MC5, que viria ao Brasil apenas para tocar aqui!! Seria um momento histórico não só para Goiânia, mas para a história do rock no Brasil. Temos um projeto aprovado na Lei Goyazes e achamos que isso nos daria a segurança de ousar tanto. Só que caímos num abismo de burocracias e entraves e não conseguimos captar todos os recursos. Daí, tivemos de recuar e cancelar não só o show, mas todos nossos planos. É frustrante ver que, depois de 10 anos, as dificuldades continuam as mesmas e, apesar de todo o reconhecimento nacional e da importância do festival para a cultura da cidade e do País, ainda recebemos pouco apoio. Mas nunca desistimos e, por isso, estamos fazendo esse 10º Goiânia Noise na raça, como sempre! Esperamos fazer como naqueles carrinhos de fricção: puxamos um pouco para trás para acelerarmos nos próximos!

VM - Parece que vocês conseguiram alguns patrocinadores... como ficou essa questão de patrocínio?

Conseguimos alguns sim. Pela lei, o Novo Mundo entrou. Eles acreditaram na idéia e estão nos apoiando. Isso é bom porque é uma empresa grande e que nunca tinha apoiado eventos desse tipo. Claro que não será o patrocínio total do nosso projeto e, por isso, tivemos de fazer algo menor. Mas isso foi fundamental para realização dessa edição. E mostra que uma empresa, que
nunca havia patrocinado eventos como esse, acredita na força do festival e em todo esse  momento que Goiânia está vivendo. Além deles, conseguimos apoio de outras empresas que sempre nos ajudam como a Tribo do Açaí, Ambiente Skate Shop, Fujisom e a rádio 89 FM. Sem essas empresas o Noise não aconteceria.

VM - Qual foi o montante de grana aprovado pela Lei e quanto vocês conseguiram captar? Como funciona este processo captação de recursos?

Tínhamos um projeto aprovado de R$ 450.000,00. Com esse projeto, faríamos um mega festival. Traríamos cinco atrações estrangeiras, bandas conhecidas nacionalmente, cobraríamos um ingresso barato, montaríamos uma super estrutura no Goiânia Arena e, em contrapartida, compraríamos e doaríamos um equipamento de som para shows, completinho, para o Martim Cererê. Lá é um espaço fantástico e que sempre foi a "casa" de muitas bandas da cidade. Esse
equipamento de som facilitaria muito a produção de shows lá. Seria uma grande conquista para os músicos de Goiânia e para a Agepel. No entanto, conseguimos captar pouquíssimo desse projeto. Apenas o Novo Mundo entrou... e muitas outras que quiseram foram impedidas por questões burocráticas.

VM - Esta dificuldade demonstra que o empresariado goiano ainda é muito resistente? Qual foi a maior dificuldade na hora de captar os recursos (tempo, disponibilidade do patrocinador...)

Ainda é sim. Muitas empresas simplesmente ignoram a importância e a força de um festival como o Noise. Os investimentos em marketing cultural visam aproximar a empresa (marca / produto / serviço) de seus públicos-alvos, possibilitando a associação de marcas a um residual de  lembranças e gerando simpatia do público em relação à marca e aumentando o conhecimento da marca. Uma empresa que patrocina eventos culturais acaba sendo mais bem vista pelos
consumidores do que outras que não investem neste segmento. Mas, em Goiânia, a maioria dos empresários acha que investir em cultura é apoiar um show do Jota Quest, do Capital Inicial, da Ivete Sangalo ou do Bruno e Marrone. Eles não conseguem enxergar que um evento como o Noise fomenta a cultura local (este ano são 19 banda de Goiânia tocando) e ainda atrai a atenção da mídia nacional! Sem falar que o público que freqüenta esse tipo de evento não faz isso por moda, mas sim por ser fiel a essa proposta. São formadores de opinião... é um público bem mais qualificado. Vincular uma marca a esse público só traz ganhos para a empresa. Mas o poder  público também tem um pouco de culpa nessa história. Alguns entraves burocráticos também dificultaram a captação dos recursos pro Noise.

VM - O fato do Noise ser um festival de rock e esse gênero musical remeter à famosa trilogia sexo, drogas e rock´n´roll gera preconceito e dificulta na hora de conseguir patrocínio ou não tem nada a ver?

Acho que não. O que falta mesmo é visão dos empresários. Eles pensam muito em termos de quantidade de público, achando que só isso que é importante. Então, preferem patrocinar o CarnáGoiânia do que um festival de música alternativa. Eles não conseguem ver que a qualificação do público é diferente e que, muitas vezes, a pessoa que está lá no Carná, nem vai se lembrar de sua marca, enquanto todo mundo no Brasil sabe, por exemplo, que o Brian Wilson tocou num festival patrocinado pela Tim. A exposição da marca é diferente, o público é diferente e a qualidade do evento também. Não estou dizendo que eles não deveriam patrocinar o Carná ou esses festivais mais pop, apenas que, dependendo da marca e da estratégia da empresa, é
importante também vincular o seu nome a um evento como este.

VM - Além do cancelamento dos shows internacionais, o quê mais vocês tiveram de mudar no plano inicial?

Mudamos tudo. Estrutura, local, formato, programação... tudo mesmo. Mas mantivemos o conceito e o perfil do festival porque isso não vamos mudar nunca. E, para esses 10 anos, tínhamos uma idéia de valorizar bandas que foram nossas parceiras ao longo desses anos. Bandas que tocaram em outras edições do festival, bandas que marcaram a trajetória da Monstro, bandas que sempre se destacaram no cenário independente... e a programação está bem
assim. Temos uma banda como a Relespública, que é está se tornando uma lenda no cenário, temos o Mustang, que é liderado pelo Carlos Lopes, o cara que praticamente inventou o metal no Brasil e influenciou até mesmo o Sepultura, temos o Cachorro Grande, que vem rompendo esse limite entre underground e mainstream,  temos Muzzarelas, Tequila Baby e Tolerância Zero, que são ícones do punk rock... e temos 19 bandas de Goiânia! Porque um dos objetivos do festival é de fomentar a cena local e este ano tem desde bandas já conhecidas como Mechanics e MQN até novíssimas como Lake, Skyfuzz e ZenTropa.

VM - Voltar ao Martim Cererê, de certa forma, é gostoso já que o centro cultural também faz parte da trajetória do festival, que teve algumas de suas edições realizadas lá? Qual é a expectativa de público? Vocês não temem que o espaço não comporte o público (dentro dos anfiteatros)?

Fazer shows e festivais no Cererê é sempre gostoso! O espaço é excelente! Os teatros são perfeitos, a área externa é maravilhosa, o Brandão é gente finíssima!! Com certeza o Cererê faz parte da história da Monstro e do rock em Goiânia e, por isso mesmo, queríamos ter doado o som pra lá. Em relação ao público, temos uma expectativa boa e pensamos assim: já que não
conseguimos fazer um mega festival, vamos fazer então para quem realmente dá valor. Então, será um festival para aquele público específico e que realmente gosta e acompanha essa história de rock independente. São mil ingressos por dia e pronto. É só mesmo pra quem gosta.

VM - Alterar uma agenda tão comentada, inclusive pela mídia, e cancelar o show do MC-5 (nunca vou me conformar com isso) é um desapontamento, claro. O que vocês fizeram para recuperar o ânimo? Quais são as grandes apostas desta 10ª edição e por quê?

Foi um baque muito grande ter de ligar e cancelar o MC5, ainda mais porque os caras estavam super animados com esse show e, provavelmente, seria o último deles. Foi mesmo difícil recuperar... mas lembramos que o mais importante era fazer o festival. Não quebrar a seqüência. A Monstro já passou por outros momentos assim (em menor proporção, claro), mas nunca
deixamos de fazer os festivais. Somos chatos e persistentes e não é qualquer um que vai nos fazer desistir! Em relação às apostas, acho que são essas bandas que citei. Bandas que são importantes para a cena, para o Noise e para a Monstro. Além disso, tem muita coisa nova e legal na programação. Astronautas, Daniel Belleza, Retrofoguetes, Irmãos Rocha!, Jumbo Elektro,
Sapatos Bicolores... tem banda desde Porto Alegre até Belém, do Pará, como é o caso da Eletrola. O 10º Goiânia Noise está bem diversificado... muitas linguagens, muitos estilos, muitos sotaques... vai ser bem divertido!

VM - Nestes dez anos de "sangue, suor e lágrima", o que mais compensou? A missão de vocês está cumprida?

Talvez algumas já possam estar cumpridas, mas surgem outras a cada ano. Ainda não pensamos em parar e estamos com gás para outros 10 anos de Noise! Não conseguimos fazer um mega festival nos 10 anos do Noise, vamos tentar nos 10 anos do Bananada ou nos 15 do Noise ou nos 20... conseguimos tornar realidade uma absurda idéia de tornar uma cidade no interior do País num verdadeiro centro disseminador de rock. Agora, vamos brigar para manter isso. Custe o que custar!

 
nádia timm
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