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Aya Sofia

Expelidos interplanetários

por Max Miranda

Onde ele caminhava, um rastro de delícias era esparramado. A amava. Muito infinitamente, no fundo dos segredos mais íntimos. Era de honestidade invejável, assim como as luvas de sua esposa... carne em telas, um tesouro de mulher; e sua genitália era um baú de mistérios e músculos ativos. E ela quer rua. “Vou à taberna; pão para a manhã. Beijos”. Ele, além de inteligente, paciente e tolerante, a amava. Outras vezes, tantas elas, poucos ciúmes, todas as traições de Miólli – aconteciam na Saln, capital da Dnia, Griia, situada no golfo de seu nome.

Mugidos. Assovios. Cirandas. Pássaros. O lago da montanha. E ali, nele imerso, Poseydin avistava a torre do casarão de Aya Sofia. O pai da criatura era considerado um homem tenso, resolvido. Mandava no “agora” da cidadela. Sofia, a primeira das três filhas. Onde é o pequeno castelo existia a Catedral de Santa Sofia, construída no século VI e transformada em mesquita no século XVI.

Estar no topo da montanha, enquanto Miólli estendia sua boa vontade a outros homens do vilarejo, significava para Poseydin um presente aproveitável. Uma “spapoo”.

Era quente a água. Brotava de uma fonte vinda dos favores do Mar Egeu, acariciada pelos galhos verdes da floresta e se instalava na pedra, o esperando, o esquentando. Eles viviam das plantações. Poseydin comercializava cereais e interava com serviços extras; trabalhava porque passava tão bastante o tempo na Saln. Farinha, casulos de seda, cromo, ferro, manganês.

Tabaco, ópio. Ele desceu, chegou em casa. Miólli não estava. Bilhete acima, perto do pote de pós, na lareira acesa. Ajeitou o colarinho, foi retirar água rapidamente. Saiu. “Doce Miólli, preciso me comunicar com os compradores, passarei por importantes ferrovias e ainda assuntos a tratar na Filosofia”. Bebidas, tecidos, tapetes e alimentos... Mólli leu, e queimando, enquanto viravam as costas, o bilhete ficou. Apagou todas as luzes da casa, desceu até a adega, três garrafas eram trazidas... em malabarismo contente.

Aya Sofia acordou cedo demais esse dia. Chegaria uma equipe de arqueólogos, solicitada por ela ao pai. Decidira terminar a árvore da família Aya. Escavações revelaram objetos como a caixa que continha o conceito do “agora”. Contagem das preciosidades.

Aya Sofia soubera mais de si. E resolveu acreditar desde então na existência do decote, do volume dos seus seios. Sua história estava farta de sentido. Vestido e passeio na montanha, sozinha. A mocinha que havia em Miólli apareceu durante dias. Poseydin continuava sua viagem. Meses, risos, atropelos, caminhadas largas, manhãs leves, brisas e riachos e muitas aves... corujas, pombos, pássaros, bichinhos, alegria, raízes, espera, novidades, bússola. Volta. O ar dizia que, em breve, Poseydin retornaria à Saln. Olhos e mentiras e coração. Tudo à espera dele. Em meio à tempestade e à sinfonia transparente, subia rumo à função de desbravar seu corpo no corpo de Miólli no corpo de Aya Sofia no corpo da vida... Clareava o dia. Batia à porta: “Mióóólliiii!”, com emoção. Caíram na cama, prontos, limpos e frescos. Brancos e cremes, suores. Os rápidos. Os raptos, os ratos, os gatos; matos, esconderijos. Poseydin subiu outra vez a montanha; a água molharia seu amor infeccionado, e o curaria... e saudades de Aya Sofia, de sonhos e delírios. As escrituras encontradas no fosso tomaram um norte na vida de Aya. Estreitos, e o tempo era do lado do sol, e nunca aparecia do lado da lua. Noites eternas no fim da montanha... e nada havia de gelado.

[olhos acesos, e batia o coração sob a coberta... Aya correu até a camisola, abriu a porta como se tivesse apenas alma; em repentina dor de saudade. E Poseydin a espera. Um, dois, três... nos lábios dele, de olho na lua; e Miólli solta por aí...]

A vida era saudável no vilarejo.

Umas folhas se mexeram. Dois corpos agora habitam o poço da montanha Kyhaiôa. A majestade de pontas verdes que espalhava esperança. Aya e Poseydin imersos, de no molho cristalino das águas. Aquário de duas guelras. Sobreviventes da história liquida que é o amor. A mão da natureza os amparou, enquanto o coração de Miólli escorria, perfurando pelas traições. Não fora punida porque traição não era crime em Saln, mas o perdão era praticado ali como um passatempo. Miólli viveu bem, por muitos anos, fazendo o que gostava de fazer.

Emersos. Gotas. A brisa secou dois corpos, silhuetas e marcas de sombras ingênuas. O gavião, a gralha morta e a pele com som de gaita. Aquele mundo era uma loucura. Expelidos interplanetários.

Presas vivas. E quando dançavam tinham palmas, e gritos e passos. Salão, degolação. Pensamentos. A primavera chegara. Nervos acertam, pontarias noturnas debaixo dos lençóis do quarto do casal... piano, harpa, arpão, peixes, tocaias. Tocais! Sabendo da situação do temporal, havia sopros profundos na carne deles. Que expulsa o remédio das horas. Alivio da existência dada. “Agoras” herdados. Chicotadas do deus seletivo e de caráter macio, agradável... e quem tem o dom de perdoar somente Ele [por assim mencionar seu poder, antes de tudo, um pecado não reconhecer que algo atende seus pedidos] escreve, expele. A ternura de Aya. O rastro de vulcão de Poseydin, as plumas traidoras de Miólli e as histórias que a terra absorveu e devolveu.

Seres devolvidos para cuidar do resto do mundo. Desenvolvidos pelo inverso da criação, pelo teste de existir agora. E a culpa recai sobre a cabeça de Aya Sofia: acusada de descobrir nosso caminho. Que nos tirou a curiosidade de viver para sempre. Houve fusões, e raças apareceram para apagar, de vez, a sintonia. É por isso que há, hoje, desequilíbrios incabíveis lançados por-algo-para-algo muito rapidamente. “Tempo, que imagem tenho de ti?”, chora Poseydin – ecoa do pico da montanha para o resto da humanidade. Quem perverteu foram as risadas de Miólli. Atiradas como lapadas na cara dos idiotas que iam se formando... Como a chuva lava; e para o esgoto caminham tantos... [fase do êxtase]

Agonias e revoltas, mas girassóis são plantados para acolher o pólen da vida, jogado de cima; como alimentar porcos... Como se não bastassem os castelos da época, as fortalezas que se levantavam comia a floresta, que perdia sua calma, sua cor, sua temperatura.

Poseydin jamais aceitaria perder sua natureza afável. Banhava ali, perdoando. “Me tirariam a pureza?”, gemia tolerante. “Oh, Miólli, esquente-me agora!”. Também queria a moça-lava. Escorreram por vielas, deleite enquanto a desordem era chamada de calada da noite, intranqüila para os seres possíveis. Os fatos impossíveis marcaram o regresso – um pastor secreto travou o futuro, algo entoando contra foi banido por deuses protetores, que colocaram muitos seres na redoma... proteções injetáveis e expelidas; não foram impedidos, soltos de qualquer jeito e decidiram a vida construída a esmo. O perigo da vida foi gerado sem o consentimento do vento: nasceu asfixiada. E germinou, até acreditar que não passavam de plantas bobas; eram usados com palavras achadas. Como as escavações de Aya, os desejos de Miólli e as concordâncias bem feitas de Poseydin. Ganharam um motivo e fizeram dele a moeda; enfim as trocas... e os trocados caiam do seu bolso, esparramando um rastro de delícias Viu? Não era nada daquilo!

Mais um pouco do fim dos dois: possuíam uma química como possuir um violino Stradivarius é, seguramente, o maior sonho de todo violinista. O amor de Miólli e Poseydin era de aparência simples, mas de extraordinária complexidade. Stradivarius!

 

 
nádia timm
R E V I S T A . E L E T R Ô N I C A