Mas o que é a Bolívia?

Se Evo Morales não conseguir 50% dos votos no domingo, o novo governo pode ser definido pela oligarquia do Congresso. EUA, Chile e a burguesia de Santa Cruz de la Sierra contam com esse impasse para transformar a Bolívia em mais um epicentro da “guerra infinita” de George W. Bush.

 

Emir Sader

      

– “Bolivia, what a hell is Bolivia?” (Sundance Kid)
– “It’s a country, stupid!” (Butch Cassidy)
Mas há ainda os que não sabem disso. Mark Falcoff, assessor especial do vice-presidente dos EUA, Dick Cheney, afirmou: “A Bolívia deve ser varrida do mapa”. O que pode parecer uma quimera imperial com um país longínquo, possuidor de riquezas de hidrocarburos que os EUA ambicionam, não se resume a isso.

A rainha Vitória, quando sentiu os interesses da sua Coroa contrariados, ordenou que suas esquadras invadissem a Bolívia. Quando lhe esclareceram que a Bolívia não tinha saída para o mar, resignou-se: “Deixem, esse país não existe”.

Mas a Bolívia tornou-se um país mediterrâneo a partir da expropriação de parte do seu território pelo Exército chileno, na Guerra do Pacífico – em que o Peru também foi extorquido – e quando triunfaram os interesses britânicos de exploração do estanho, que se instalaram no norte do Chile, nos novos territórios tomados aos países vizinhos.

A preocupação com a situação interna na Bolívia e, principalmente, com a política para os hidrocarburos, é um dos fatores que levaram os EUA a instalarem tropas no Paraguai – justamente num momento em que têm dificuldades para contar com a recém inaugurada base militar em Manta, no Equador.

Na Bolívia, os EUA contam com ainda com as pressões separatistas da burguesia de Santa Cruz de la Sierra, que saudariam uma intervenção de “marines” dos EUA provenientes do Paraguai. São estes que se encontram na base militar Marechal Estigarribia, em território paraguaio, a apenas 200 quilômetros da fronteira boliviana. Outro ponto de apoio dos EUA vem do estacionamento de tropas chilenas com uniforme da ONU na região do altiplano. Até março deste ano, o Exército chileno contava com mais de 30 mil militares estacionados na zona fronteiriça com a Bolívia.

Assim o Chile se candidata a ser Israel da América Latina, como aliado privilegiado dos EUA na região. Assinou um vergonhoso acordo bilateral com o governo estadunidense, com as esperadas vantagens para o país do norte: aumentaram em 65% as exportações chilenas – de produtos primários e semi-manufaturados, mas se elevaram em 95% as importações dos EUA, de produtos manufaturados (máquinas, produtos eletrodomésticos, elétricos e componentes, produtos químicos, produtos eletrônicos e de informática), confirmando as desconfianças brasileiras sobre quem ganha nos acordos de livre-comércio entre parceiros muito desiguais.

Além desse vínculo, o Chile tem de responder sempre às reivindicações da Bolívia para a devolução da sua saída ao mar, aliando-se mais estreitamente com a potência imperial que acredita que a Bolívia “deve ser varrida do mapa”.

Depois de uma grande mobilização interna em 2000, que impossibilitou a privatização da água, os movimentos sociais bolivianos – principalmente indígenas e camponeses, dedicados em parte à produção da folha de coca – passaram a reivindicar uma renegociação da política de exploração e exportação de hidrocarburos, assim como a convocação de uma Assembléia Constituinte. Sanchez de Losada e seu vice-presidente, eleitos, não resistiram às pressões populares, ao tentar manter o velho modelo neoliberal e a política privatizante dos recursos do gás, e acabaram derrubados.

Nas eleições deste domingo (18), pela primeira vez na história desse país, de profundas raízes indígenas, um líder com essa origem é favorito para se tornar presidente do país – Evo Morales.

O problema é que, se ele não obtiver pelo menos 50% dos votos, o segundo turno se transfere para o Congresso, onde as forças da oligarquia tradicional deveram manter maioria. Neste caso, o risco do voto popular ser anulado pode ser grande. O país entraria em uma situação muito incerta, porque provavelmente o povo boliviano não aceitará passivamente o seqüestro de sua decisão, que deveria ser soberana.

Os EUA, o Chile e a burguesia de Santa Cruz de la Sierra contam com um impasse institucional para apostar na invasão e na transformação da Bolívia em mais um epicentro da “guerra infinita” do governo Bush. O governo brasileiro e as forças democráticas do nosso país têm de manifestar ativamente seu apoio à decisão soberana que o povo boliviano tome neste domingo.

O risco para a democracia no continente reside assim nas ameaças de intervenção dos EUA e no estacionamento de suas tropas, aliadas às de um país como o Chile, no coração da América do Sul – a única região do mundo em que existem processos de integração regional – em que o Brasil tem um papel essencial – de caráter autônomo em relação à potência imperial.

Na Bolívia se joga, em grande parte, o futuro da América Latina.

 


Emir Sader, professor da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), é coordenador do Laboratório de Políticas Públicas da Uerj e autor, entre outros, de “A vingança da História".

 

publicação autorizada pela Agência Carta Maior

www.agenciacartamaior.uol.com.br

dezembro 2005

 

 

 

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