Matéria

6 de maio de 2005

As implicações familiares da inclusão

 

CELESTE AZULAY KELMAN

Há quase 15 anos, a Organização das Nações Unidas (ONU) adotou o conceito de sociedade inclusiva para deslanchar um esforço coletivo dos países participantes no sentido de empreender esforços para a inclusão na sociedade de grupos historicamente segregados. Poucos anos depois, esse conceito teve repercussões na área educacional, gerando o conceito da educação inclusiva. A idéia era tornar possível a participação de crianças anteriormente apartadas do cotidiano escolar, por questões, entre outras, de etnia, gênero, pobreza ou por possuírem algum tipo de deficiência.

Atualmente, observam-se esforços das escolas e das famílias para incluir alunos que apresentem algum tipo de necessidade especial. Antes de ser incluída na escola, é necessário que a criança seja incluída em sua própria família. É no núcleo familiar que se encontra a gênese do desenvolvimento e, portanto, a base da formação de sentimentos positivos como autonomia e autoconfiança.

Quando uma criança nasce ou adquire precocemente algum tipo de deficiência, pais e familiares passam por um processo que pode ser descrito em três fases: luto simbólico, informação e reparação. O luto simbólico é descrito na literatura como a vivência da perda do filho idealizado, que viria para cumprir as expectativas narcísicas de seus pais: ser bonito, inteligente e “perfeito”. Quando isso não ocorre, os pais têm de elaborar o processo de perda desse filho ideal. A fase seguinte é de busca de informações sobre como proceder com o filho que apresenta uma necessidade especial. É preciso entender quais são as reais capacidades da criança que apresenta uma limitação de ordem física, sensorial ou mental. A terceira fase é de potencialização daquilo que a criança é capaz. Trata-se de atingir o máximo desenvolvimento, dentro do possível. Isso freqüentemente inclui interações amorosas e prazerosas, que respeitem a maneira peculiar de existir.

No contexto da família, como os pais devem proceder para promover a relação entre irmãos quando um deles apresenta uma necessidade especial? Em primeiro lugar, devem cuidar para que o filho surdo, cego, cadeirante ou que apresente qualquer outra limitação física ou mental não absorva todas as atenções do casal, evitando o surgimento de ciúmes ou raiva entre os demais irmãos. Todos merecem a mesma atenção, sem nenhum tipo de discriminação, sob risco de gerar um clima afetivo negativo, não integrador.

O sentimento de culpa, por exemplo, pode se desenvolver no irmão que não tem nenhum tipo de necessidade especial, influenciando negativamente o seu próprio desenvolvimento. Os pais devem estar atentos a esse tipo de conseqüência e devem promover, no contexto familiar, o conhecimento de como lidarem com o irmão que apresenta uma necessidade especial, suas limitações e potencialidades.

Uma idéia interessante é o exercício do role-playing, ou seja, fazer os outros filhos experimentarem as características peculiares do irmão ou irmã, sempre que possível. Venda nos olhos, protetores auditivos ou sentar na cadeira de rodas do irmão são experiências que os filhos devem vivenciar de forma lúdica para compreenderem melhor a limitação do irmão. Por outro lado, os pais devem estar atentos às necessidades básicas de qualquer criança, entre elas o brincar. É importante estimular brincadeiras entre os irmãos, adaptando jogos ou brinquedos, se necessário.

As surpresas serão com freqüência agradáveis, ao perceberem que o irmão cego pode ser ensinado a jogar futebol com “bolas sonoras”, por exemplo, contendo guizos. A participação dos pais nas brincadeiras entre irmãos os estimula a respeitar o outro em suas características especiais de desenvolvimento.

O clima gerador de amizade, solidariedade e cooperação entre irmãos os levarão a ajudarem aquele na realização de pequenas tarefas do cotidiano que sejam dificultadas pelo impedimento específico, como descrever algum objeto ou fato para o irmão que apresente uma deficiência visual; explicar determinada situação para o irmão com retardo mental; ajudar a vestir ou alcançar objetos para o irmão com dificuldade de locomoção ou sinalizar algum significado para o irmão que seja surdo. Aliás, algumas experiências escolares fazem com que crianças ouvintes freqüentem classes de surdos, uma integração às avessas, justamente para que irmãos ouvintes possam aprender a se comunicar com os surdos em língua de sinais.

Ambiente familiar inclusivo é a base para o bem-estar e segurança das crianças com necessidades especiais. Trata-se de condição necessária, porém nem sempre suficiente, para a inclusão na escola e na sociedade.

Roberto Fleury/UnB Agência

Celeste Azulay Kelman é doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento pela Universidade de Brasília (UnB), com pesquisa sobre interações de alunos surdos com professores e colegas em espaço escolar inclusivo. É professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), cedida à UnB.

 

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