Um relato de Londres

José Paulo Lanyi

 

 

As más notícias literalmente explodem quando eu estou dormindo. Foi assim no dia 11 de setembro. Eu tinha acabado de acordar (sim, tarde, como quase sempre) quando o Serginho Carvalho Filho, meu parceiro de teatro, me ligou:

- Jogaram dois aviões contra o World Trade Center, outro caiu no Pentágono.

- Serginho, não me encha o saco - respondi, dando risada.

Claro, não lhe dei crédito, a gente vivia fazendo textos imaginários do 007. Hoje, oito e pouco da manhã, minha namorada me ligou para falar de amor. Bom acordar assim... Mas a desgraça veio junto, minutos depois, quando ela me contou das explosões em Londres.

Desta vez, acreditei...

Não tinha amigo em Nova York, mas tenho na Inglaterra. Logo pensei na Tônia. Nós trabalháramos juntos, anos atrás. Às vezes, no meu rodízio, ela me dava carona no fusquinha dela. Morávamos perto um do outro, lá no Brooklin. Sensacional, aquele fusquinha azul! Mítico...

Tônia Azevedo se formou na Cásper, em Jornalismo, e fez locução no Senac. Na Rádio Gazeta AM, foi editora e produtora na área esportiva; na Globo AM, produtora-executiva, também em Esportes. Foi, ainda, repórter e produtora da Rádio 2 e assessora de imprensa do São Paulo e da Portuguesa de Desportos, a Lusa, entre outras missões.

Levantei e fui para o computador. Felizmente, ela já havia tranqüilizado os amigos. Em meio a tanta estupidez, uma boa notícia: a minha amiga estava inteira.

Pedi-lhe um relato. Ei-lo:

"A gente nem lembrava mais que isso podia acontecer. Por um tempo, depois do atentado ao World Trade Center, ou 'nine-eleven', como sai no noticiário em inglês, todo mundo que eu conheço aqui em Londres tentou evitar usar ônibus, metrô e trens ao máximo, mas no dia-a-dia isso se torna impossível: escola, trabalho, responsabilidades, tudo exige que você se locomova e, numa cidade desse tamanho, poucas pessoas podem se dar ao luxo de não precisar de algum meio de transporte público.

Hoje eu estava na escola, eram dez horas da manhã. Antes de sair de casa, enquanto tomava café e me vestia, eu tinha assistido ao noticiário matutino da BBC, como faço todo dia. Até as 9h30, ninguém tinha falado nada. Foi no meio da minha aula de computação que a amiga de outra aluna brasileira ligou e deu a notícia. Deixei a escola a pé e voltei para casa (umas oito quadras), peguei a bicicleta e vim trabalhar. Cheguei sem fôlego porque estou (como sempre) fora de forma, mas nada de pegar ônibus hoje...

Jornalista no Brasil, em Londres trabalho como recepcionista numa universidade, chamada Imperial College, em South Kensington, considerada Região 1, já no centro da cidade, mas longe da área das explosões. Os prédios do College foram fechados, a segurança entrou em alerta, a rua ao lado (Exhibition Road, bem perto do Hyde Park) também foi fechada. Houve rumores de bombas em estações de metrô que não teriam sido noticiadas, mas nada foi confirmado. Uma colega colombiana, Carolina, não conseguiu chegar porque toda a rede de metrô foi paralisada e os ônibus que cruzam o centro de Londres, impedidos de circular na região.

Outra amiga brasileira, Adriana, socióloga formada pela USP, estava limpando uma casa em High Street Kensington quando a dona da casa voltou, coberta de fuligem: ela estava em Edgware Road, estava exatamente no trem onde explodiu uma das bombas, uns quatro vagões para trás daquele onde ocorreu a explosão. Ela não se feriu, mas chegou em casa bem abalada. Porém, descrevendo para a Adriana o que tinha acontecido, ressaltou que incrivelmente não houve pânico: os ingleses, treinados durante anos pelos atentados cometidos pelo IRA, sabem como se comportar em caso de terrorismo...

Tentei ligar para a maioria dos amigos e conhecidos mas, apesar dos problemas para usar o sistema de telefonia celular, totalmente sobrecarregado, felizmente parece que nenhum deles esteve naquela região da cidade. Minha preocupação imediata foi com um casal de amigos do Brasil, João e Alessandra Fonseca, ele de Belo Horizonte, ela de Barueri-SP, que trabalham como cobradores naqueles ônibus antigos que são um dos símbolos de Londres, chamados 'routemasters'.

Eles trabalham em linhas que cruzam o centro de Londres mas, felizmente, não chegam até a região onde houve a maioria das explosões. Depois de muita unha roída, consegui falar com a Alessandra. Ela disse que estava perto do Hyde Park quando a garagem chamou todos os ônibus pelo rádio, mandando parar, evacuar os passageiros onde estivessem e voltar. O João também está bem, graças a Deus.

Quanto aos outros amigos, os que ainda não contatei, o jeito é esperar: as empresas de telefonia celular estão com excesso de chamadas e o sinal cai com freqüência. Mas, como diz a sabedoria popular, 'notícia ruim chega cedo'. Então, como ainda não recebi nenhuma, tenho mais que agradecer. Katia e Luis Fonseca, Peter e Rose Kalytta, Adriana Morais, Ricardo Ramos, Nilton Mattos e Roberta, Luciana Yuri, Bianca e Kamil, Andressa, Renata, Benedito, Cristina, Dayhan, Drica, Nalu Chaves e Paulo, Leandra, Marcia, Paula, Severina e Fábio, Valéria e Tony, Victor, Ximena, tantos outros...

Tantos amigos feitos nesses quatro anos de Londres, dos quais a maior parte só sei o primeiro nome, porque não se precisa de sobrenomes nessa vida de imigrante... Com alguns já falei, com outros ainda não, mas o pensamento está Lá em Cima para que estejam todos bem.

O clima durante o dia foi de expectativa, todo mundo com o ouvido colado no rádio, o olho na TV. Eu, que estava trabalhando, dependia das atualizações das páginas da BBC na Internet para saber as últimas notícias. A sensação é aquela de 'eu sabia...', mas que estava quase esquecida, afinal são quase quatro anos e, ao contrário de Nova York e Madri, 'hoje não é dia 11'. Porém, com o encontro do G8 na Escócia, a Scotland Yard, o MI5, o policiamento todo foi para Gleneagles, Londres foi deixada desguarnecida e, logicamente, os terroristas sabiam disso.

Como aconteceu depois dos ataques nos Estados Unidos, as TVs abertas mantiveram o noticiário direto sobre os eventos no ar sem interrupção desde cedo. Correspondentes na Escócia mostraram a reação dos membros do G8, enquanto outros, em Singapura para acompanhar a escolha de Londres como sede olímpica, colocaram o prefeito Ken Livingstone para falar. Rádios FM interrompiam a programação a cada dez minutos com atualizações. Mas fica aquela impressão de que 'não estamos sabendo de tudo' e que, talvez, vocês aí no Brasil acabem mais bem informados do que nós..."


 

.........................................................................................................

 

Nádia Timm Web Site . Todos os Direitos Reservados - 2005

Fale comigo
Espaço Livre Isto é Brasil Exporte Blog Comunidade da Saudade
Saúde Livros Chat Vamos Namorar?
Patrocínio Mundo Melhor Novidades Fofocas Turismo
Contato I Expediente I Capa Crônicas di-Versos Fotolog Edições anteriores Moda & Etiquetas
Leia também
 
Isto é Brasil

 

 

Anuncie na eNT e tenha acesso ao maior número de pessoas de alto nível e
maior poder aquisitivo

 

O mercado que vai direto ao consumidor

 

 

Faça parte dos novos tempos de publicidade

 

Anuncie aqui na eNT e multiplique os seus negócio