Matéria

23 de janeiro de 2005

Brasileiros na guerrilha ambiental

Quais ações imediatas do SOS Mata Atlântica envolvem o cidadão brasileiro?

Mário Mantovani - Esse é nosso forte. Campanhas online para plantios, no site www. sosmataatlantica.org.br (Click árvore). Observatório Parlamentar para consulta permanente, a Plataforma Ambiental para vereadores e prefeitos, que vai se tornar nosso principal documento em 2005, com a publicação de um manual de guerrilha ambiental para o cidadão em seu município.

Estaremos também com uma campanha para pressionar os senadores e o governo. O Atlas vai estar mais amistoso e estaremos criando um ranking de qualidade ambiental da mata atlântica por percepção da sociedade.

E o foco do trabalho atual da Fundação SOS Mata Atlântica?

Mário Mantovani - Tentamos reverter o processo de degradação desse bioma que hoje resta, em apenas 7%, em 17 Estados Brasileiros. São aproximadamente 3.500 municípios, onde 60% da população teve mata atlântica no seu quintal.

Sem esse entendimento não conseguiríamos fazer política pública, tratar da proteção da água, educação ambiental, financiamentos de grandes projetos, entre outros. Queremos ser um centro de referência dessa luta.

Qual a reflexão de 18 anos de atuação da ONG. Quais os passos para 2005?

Mário Mantovani - Tenho mais de 35 anos de militância no movimento e o que mais me chama a atenção foi o fato de termos uma organização nacional que vive de sócios, que articulou a rede de Ongs da Mata Atlântica, entre outros, e que tem como atuação a mobilização. Com isso pudemos trazer o tema da Mata Atlântica para o dia-a-dia das pessoas.

Hoje, o Atlas sintoniza os acontecimentos, os projetos são referência e podem ser replicados. Queremos manter essa ação de caráter nacional e buscarmos maior integração com os Gestores Locais que assumiram esse ano. Estamos lançando um material específico para prefeitos e vereadores na linha da plataforma ambiental.

De onde vem o dinheiro das campanhas publicitárias da organização SOS Mata Atlântica?

Mário Mantovani - Nestes 18 anos a SOS vem marcando sua atuação com apoio das mais diversas agências de publicidade, inclusive a logomarca feita pela DPZ.

A partir daí, passou a ser uma constante esse tipo de ação das agências e dos veículos que fazem gratuitamente as campanhas. Inclusive ganhando prêmios internacionais todos os anos. 

O Projeto de Lei da Mata Atlântica (nº. 3.285/92) está em análise há 12 anos, no Congresso. Por que emperra?

Mário Mantovani - Esse caso é emblemático, porque está parado no Senado e utilizado pelo Senador Borhausen como peça de chantagem contra o governo nos seus interesses.

O fato é que neste tempo não ficou parado, ela foi regulamentada em todos os Estados e no Conama, foi cotejada com a lei dos crimes ambientais com a lei dos recursos hídricos, com o Sistema de Unidades de Conservação etc, etc, e foi o fio condutor de nossa ação.

Agora é continuar a batalha. Denunciar o Senador e pressionar o Senado e o Governo Federal.

Quais os principais resultados obtidos pela Ong?

Mário Mantovani - Conseguimos pôr o tema na agenda da sociedade brasileira. Buscamos aproximar essa luta com o dia-a-dia das pessoas e não ficar identificados como quem quer proteger o mico-leão e esquecer do bicho gente.

Com certeza o Atlas é nosso grande trabalho, pois a questão do desmatamento deixa de ser 'xororô' de ambientalista para ser um indicador técnico científico. É feito por nós e o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Serve de referência para nossos projetos e a justificativa para o "Estão tirando o verde da nossa terra"

O que se tem feito no Brasil para recuperar e manter os 7% de Mata Atlântica nos 17 estados onde há remanescentes?


Mário Mantovani - A rede de Ongs da Mata Atlântica tem um projeto de desmatamento zero e temos um tipo de atuação em cada estado e região.

Por exemplo, a luta contra a forma de atuação do Prodetur (Programa de Desenvolvimento do Turismo) no Nordeste ou a Barragem de Barra Grande no Sul.

Sem contar com a pressão no Congresso para a aprovação do projeto de lei e as regulamentações nos estados. educação ambiental e mobilização.

Quais são as metas de atuação da Ong até 2023?

Mário Mantovani - Estamos fazendo um ato de reflexão neste semestre para lançar os temas dos próximos 18 anos no segundo semestre. Contamos com um sem número de stakeholders que têm orientado uma pesquisa quantitativa, e qualitativa, sobre nossa atuação e isso será matéria prima pra nossa atuação.

A legislação brasileira limita a criação de Ongs? Isto é bom ou ruim ?

Mário Mantovani - A legislação não dificulta a criação. O que é ruim é a falta de transparência por parte das Ongs que tem gerado um desentendimento e provocado a má fé de segmentos empresariais e políticos com relação a resistência a seus interesses.

Por outro lado é bom essa demanda para readequação das Ongs, que começou com as OSCIPs e OS e vai por ai afora, com CPI e Ministério Público

Qual o prejuízo sofrido pela Mata Atlântica nesses 12 anos em que o projeto de lei `tramita` no Congresso?

Mário Mantovani - Estamos perdendo ainda um campo de futebol da floresta, a cada quatro minutos.  E aqueles que querem fazer seus projetos para detonarem os 7 % restantes têm abrigo nesse impasse do Decreto 750 em vigor e a resistência de alguns órgãos públicos que apostam na não aprovação do projeto de lei. Como foi o caso do Estado do Paraná, na gestão de Jaime Lerner.

O que falta para os parlamentares votarem?

Mário Mantovani - Falta vergonha na cara por parte do senador Borhausen e uma ação mais enérgica do Governo.

Não é possível continuar vivendo sobre ameaça de chantagem por conta do código florestal na Amazônia, ou as questões da bancada imobiliária com relação as APPs nas cidades.

De nossa parte, muito mais mobilização e dar um peso político nas nossas intervenções junto ao Congresso.

Quanto aos aspectos regionais, como analisa a situação na região sul?

Mário Mantovani - Essa região é a mais problemática, pela postura do Estado do Paraná nos governos passados e pelos interesses da bancada ruralista concentrada nessa região, de onde veio grande parte da ação contra o projeto de Lei.

Só pra lembrar: o Paraná foi o campeão de desmatamento, de 1985 a 1990, e retomou o posto de 1995 a 2000. Por outro lado, quem salvou o projeto de lei, no início dos anos 90, foram os governadores destes estados.

Mas os interesses ruralistas são conflitantes por insistirem que a lei só alcança as florestas ombrófilas densas no litoral e não as outras formações florestais no interior (estacionais) indo contra o último mapeamento do IBGE.

Os fundos ambientais nacionais, como o Fundo Nacional de Meio Ambiente, disponibiliza verbas, mas ninguém vê o resultado. Qual sua avaliação?

Mário Mantovani -  O FNMA é um indicativo.  O mais grave é o orçamento do Brasil que tem nos últimos valores para o meio ambiente. Pra piorar, não executado em mais de 60%, e é parte do ajuste estrutural para a geração de superavit primário, por conta desse governo. Sem contar a incompetência na gestão desse magro recurso.

Como a organização lida com as carvoarias em Minas Gerais?

Mário Mantovani - Estamos pressionando o IEF para maior controle e buscando parceiros e empresas que fazem o uso correto para serem referências, principalmente os certificados pelo FSC como é o caso da Plantar e Manesmman.

Ainda procurando fazer o IBAMA funcionar, porque está muito longe nas suas ações com relação a reposição florestal obrigatória e a determinante - e não realizada - fiscalização em qualquer estrada, por onde passam os caminhões impunemente, como acontece nas conhecidas regiões de carvoaria.

De que forma a sociedade civil colabora com projetos da SOS?

Mário Mantovani - No nosso caso sendo sócio, pois vivemos dessa contribuição. Só pra lembrar: são mais de 100.000 mil sócios que contribuem para executarmos nossa missão e infernizamos o pessoal que joga contra o patrimônio nacional, a Mata Atlântica.

Quais são valores, por exemplo, do orçamento 2004 e 2005, do MMA? O que tinham de verba e executaram?

Mário Mantovani - Temos o orçamento de 2004 destacado, as ações para a Mata Atlântica, no Observatório Parlamentar (portal). Outra forma de acessar essa peça é no site www.inesc.org.br, ou do Ministério da Fazenda, ou ainda solicitar à comissão do orçamento da Câmara dos Deputados.

É uma vergonha. Além de não existirmos, vemos privilegiadas as grandes obras do Avança Brasil (Transposição do São Francisco) sem estudos de impactos e impunemente garantidas, entre outras, a execução é um capítulo a parte, atestado de incompetência.

No Fórum Social Mundial serão debatidos os problemas que ameaçam a preservação do bioma. Qual será debatido com mais rigor?

Mário Mantovani - A questão da aprovação do Projeto de Lei, sem a qual esses outros temas prosperam e são acobertados pelo vácuo de atuação entre os níveis de governo. Estaremos com essa iniciativa chamando a atenção para os clássicos temas que agridem a mata atlântica e lançando as bases para nossa atuação nos próximos 18 anos.

Ainda realizaremos oficinas sobre monitoramento participativo e gestão de recursos hídricos, lançando livro sobre percepção ambiental e renovando nossa alianças com as Ongs sócio-ambientais planetárias

Qual a avaliação da atual gestão do MMA, Ibama e Conama?

Mário Mantovani - Nossa avaliação fica prejudicada pela falta de constância da ação do MMA no Bioma e por termos um IBAMA ainda com problemas de entendimento com todo o SISNAMA.

Avançamos em temas importantes no espaço mais privilegiado de políticas públicas garantido no CONAMA. Na verdade, a atuação desse órgão ainda é reativa e para falar a verdade um salve-se quem puder, perigoso para a proteção e o uso da nossa Mata Atlântica

No Estado do Rio de Janeiro, a SOS tem atuação de preservação em alguma localidade?

Mário Mantovani - Trabalhamos em parceria com as Ongs locais e priorizamos o Vale do Rio Paraíba, na região de Itatiaia, na APA da Mantiqueira.

Nosso trabalho sistemático - de mais de cinco anos - na proposta do plano de gestão da APA  do Cairuçu e da reserva ecológica de Joatinga, com um projeto do GEF com bacias hidrográficas do norte fluminense, além de termos o maior número de RPPN do Brasil que apoiamos nesse estado.

Fora isso, temos um grande interesse em trabalhar mais no RJ, pois é onde temos o maior número de sócios (20 mil !) resultado da nossa pressão com relação aos desmatamentos na região.

Quanto resta de Mata Atlântica no Paraná? O estado ainda lidera o ranking de desmatamento?

Mário Mantovani -  Restam apenas 3.920.000 hectares da mata original, o equivalente a 20% da área original. Você pode saber mais ainda em www.sosmatatlantica.org.br, onde tem os municípios todos do Paraná. Até provem o contrário o Paraná não deixa nada pra ninguém.

Como analisa a destruição da fazenda Araupel, no oeste paranaense? A compra da fazenda para reforma agrária foi uma das apostas do governo federal na questão fundiária, mas grande parte da área havia sido destruída pelo MST em acampamentos anteriores.

Mário Mantovani - Esse é um caso exemplar do descompromisso com as questões sociais e ambientais dos governos anteriores, e atual, nos mais diversos níveis de governo.

O maior desmatamento identificado por nós nos últimos 18 anos aconteceu no município de Rio Bonito do Iguaçu, onde temos a Araupel.

O MST foi a mão do gato no teto de zinco quente. o Incra foi conivente com a depredação da área. A empresa refém dos governos federal e estadual. Uma seqüência de crimes acobertados pela incúria, incompetência, ganância, omissão, onde a sociedade foi prejudicada e a mata atlântica vítima fatal.

ONGS internacionais ajudam projetos nos principais hotspots mundiais, como o Brasil com a mata atlântica. Há muita verba sendo colocada, mas continuamos assistindo desmatamentos. O que acontece? Má fé de quem gerencia o dinheiro, projetos incipientes, falta de educação ambiental do povo e  ou questão social muito problemática?

Mário Mantovani - Sim, no caso da Mata Atlântica há recursos do Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos para serem aplicados nos corredores de biodiversidade, Central da Mata Atlântica e da Serra do Mar.

Há vários projetos e iniciativas em andamento com foco nessas regiões, que, de certa forma, vem contribuindo de forma a evitar duplicidade de esforços. Há outros recursos que deveriam ser aportados e não foram. Há ainda falta de efetividade dos órgãos de fiscalização e controle na gestão dos remanescentes florestais.

Qual será a participação da SOS nos estudos de impacto ambiental do Gasoduto do Nordeste, da Petrobrás, que vai custar cerca de R$ 1 bilhão e deve entrar em operação em 2007?

Mário Mantovani - Não temos nenhuma participação nesse estudo. Isso é responsabilidade da empresa e dos órgãos licenciadores e vamos participar das audiências e ceder nossos dados para embasar os conta estudos se preciso for, e, ainda, estaremos trabalhando com as articulações do GT energia do Fórum Brasileiro de Ongs e tentando conter a fúria desenvolvimentista da ministra Dilma Roussef.

A SOS realizou, em março de 2004, uma atividade em parceria com o Instituto Alpargatas, sob patrocínio da Thimberland. Na Ásia, assolada pela tsunami, o trabalhador é explorado pela Nike. Esse tipo de associação interfere na imagem de uma ONG?

Mário Mantovani - Não realizamos nenhuma atividade com esse instituto e esse caso da Nike parece aquele caso do mapa do Brasil sem a Amazônia, nas escolas dos Estados Unidos, que todo mundo quase acredita ou negócio de aumentar o pênis em 7 cm ...acredita, mas deve estar vendendo muito porque tem até propaganda no msn.

Claro que isso interfere na imagem das Ongs e isso tem sido recorrente e muitas empresas querem comprar indultos com Ongs. Nós temos um controle jurídico rigoroso para realizarmos parcerias e ainda respondemos ao Ministério Público no caso de uma cagada nossa.

Há projetos de trabalho que beneficiem cidades de região originária de Mata Atlântica, mas que, atualmente quase não dispõe mais desse ecossistema (como o caso, Varginha, Sul de Minas)?

Mário Mantovani - Estamos trabalhando no sul de Minas com a APA da Mantiqueira e para aprofundarmos nossa ação precisamos de parceiros locais que podemos apoiar com nossos dados e mobilização. Varginha tem ainda as compensatórias da duplicação da Fernão Dias, que não foram atendidas.  Vale a pena rever o projeto e acionar o Ministério Público.

Contato: www.sosmataatlantica.org.br

 

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