O instante descongelado

 

Cristovão Fernandes Duarte*

 

Comecemos pelo início, que é o escuro da caixa. Antes de tudo é preciso
produzir o mais puro breu. O breu total.

A escuridão absoluta, enclausuradapelas paredes da caixa. Depois vem o furo da agulha. Um furinho de nada, comunicando duas realidades distintas e complementares. Lá fora, o Mundo, tal como ele pensa que é. Aqui dentro, um mundo de mundos possíveis (e impossíveis).


Pelo buraquinho, o dentro espia o fora. O Mundo lá fora parece não se dar conta, sempre envolvido com seus muitos afazeres e atribulações, de que é observado. No entanto, um olhar de voyer atento e apaixonado não se cansa de espiar. Espiar o Mundo em sua distração cotidiana. Através do furo da agulha o Mundo, transformado em luz, é sugado pelo escuroda caixa. A passagem da paisagem para dentro da caixa produz a suametamorfose em imagem. Refeita em luminosidade etérea e radiante, a paisagem se torna visagem.


Imagem-visagem de um mundo que recusa explicações apressadas. Vultos que passam. Rastros. Gestos. Cores que se misturam. O movimento dissolve os contornos, revelando um mundo em perpétua transformação. Paisagem desfocada.Espectral. Fantasmagórica.
Ao contrário do olhar de águia que congela o foco sobre a presa, o olhar de pinhole recusa o fatalismo do instante.

O instante se dilata e respira, acompanhando a respiração do Mundo. Inspira o Mundo pelo furo da caixa obscura e expira mundos, mundos outros, oxigenados pela duração, pelo devir. O olhar de pinhole é, acima de tudo, um olhar preguiçoso. Curioso de ver, mas sem pressa de chegar. Um olhar que caminha vagaroso dentro da paisagem
(até o infinito e além!). Um olhar de ver-vendo. Para ver mais e melhor, nãopara explicar.

Não para aprisionar, imobilizar, controlar, dissecar, estripar. Um olhar que flui sem incomodar o tempo, sem interromper o fluxo da ação.
O olhar de pinhole é o olhar inaugural da infância, vendo o Mundo sem saber, ainda, que nome dar às coisas. Um olhar que espia sem ser visto, sem fazer alarido, sem perturbar a cena.

O Mundo lá fora segue seu caminho. Dentro do escuro da caixa, isto é, diante das imagens de Dirceu Maués, estamos nós. Feito crianças. Vendo mundos ressurgirem. Imagens-visagens que nos confrontam com nossa própria perplexidade diante das coisas do Mundo. Nenhuma certeza para consolar e, no entanto, nenhuma angústia. Só calma e encantamento.

*O professor doutor Cristovão Fernandes Duarte é Arquiteto e Urbanista,
Superintendente Regional do IPHAN/MinC e professor de Estética e História da Arte na Universidade da Amazônia

 

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